Entre em sua conta para ter acesso a diferentes opções

ESQUECEU SUA SENHA?

ESQUECEU SEUS DETALHES?

AAH, ESPERE, EU ME LEMBRO AGORA!

Fundação Astrojildo Pereira

FALE COM A FAP: (61) 3011-9300
  • INÍCIO
    • Quem somos
    • O que é a FAP ?
    • Estatuto
    • Documentos
    • Editais
    • Contato
    • Transparência | FAP
  • Revista Online
    • TODAS VERSÕES
  • Política Hoje
  • Temas & Debates
    • Especial Copa
  • VÍDEOS
  • PUBLICAÇÕES
  • ACONTECE NA FAP
  • BIBLIOTECA
    • Consulta ao acervo
    • Sobre a biblioteca
    • Coleções
    • Serviços
    • Contato
  • Meu Carrinho
    Nenhum produto no carrinho.

Luiz Sérgio Henriques: A cidade e os bárbaros

Foto: Revista Cult

Luiz Sérgio Henriques
domingo, 21 abril 2019 / Publicado em TD-destaque, Temas & Debates

Luiz Sérgio Henriques: A cidade e os bárbaros

Visualizações: 597

É preciso tornar à ideia da grande aliança contra os que corroem as bases da democracia liberal

No ato final do comunismo histórico, a partir de 1989, um breve e conhecido texto de Norberto Bobbio, O reverso da utopia, conseguiu dar forma e sentido ao espantoso espetáculo que então se encenava. O mais radical dos sonhos políticos da História – dizia Bobbio – havia se transformado em distopia à moda do pesadelo imaginado por Orwell. Mesmo distantes dos grandes crimes do stalinismo, os regimes inspirados na revolução bolchevique, a URSS em primeiro lugar, arrastavam-se penosamente num quadro de ineficiência econômica, pasmaceira social e autoritarismo político, no qual se abria um fosso insuperável entre ideia e realidade, palavras e fatos, grandes ideais e realidades prosaicas da vida.

As populações submetidas sublevaram-se, em geral pacificamente, em torno das mais elementares – e insubstituíveis – consignas democráticas, como a liberdade de pensamento ou de reunião. As tentativas de autorreforma, como a glasnost (transparência) e a perestroika (reestruturação), mostraram-se afinal incapazes de dar um sopro de vida a regimes esclerosados, ainda que possivelmente tenham contribuído para a saída relativamente indolor de uma situação histórica difícil. Vivia-se o momento inaugural de um mundo que os mais otimistas, ou os mais ingênuos, julgavam livre dos conflitos abertos por uma restrita e quase inapelável visão bipolar. Como sabemos, ser adepto do comunismo ou do capitalismo era mais do que ter um credo político: implicava escolhas de vida, definia destinos individuais, de um lado ou de outro da “cortina de ferro”.

A sabedoria do velho Bobbio, contudo, não descartava pura e simplesmente o comunismo e os comunistas. Estes seriam, como no extraordinário poema de Kaváfis, os bárbaros cuja presença ameaçadora, às portas da cidade, condicionava a rotina de todos, paralisava as ações, congelava tudo numa atmosfera de ansiedade e medo. E, agora, a ausência dos bárbaros – pois subitamente a notícia é que não mais viriam – implicava um chamamento brutal à realidade. Não havia mais inimigos e a vida, como requer outro verso notável, devia ser vivida como uma ordem, sem mistificação.

Num plano mais geral – perguntava-se ainda o filósofo –, as democracias saberiam dali por diante responder aos imensos problemas que tinham gerado a utopia que, no curso do tempo, se transformara no seu exato contrário e fora vencida? Conseguiriam por si sós, sem o medo incutido pelo adversário temível, ampliar as liberdades, enfrentar novas e velhas desigualdades que dividiam norte e sul do planeta e, ao mesmo tempo, voltavam a se ampliar no interior de cada sociedade, mesmo as do Ocidente desenvolvido?

Bárbaros e habitantes da cidade, para seguirmos a sugestão do sábio e a metáfora do poeta, não haviam sido jamais seres indiferentes uns aos outros. Os bárbaros de 1917, ao assaltarem os céus, invocavam frequentemente o extremismo jacobino da revolução burguesa de 1789. Distinguiam-se com veemência dos girondinos do próprio campo. A velha social-democracia, afinal, era o tronco comum de que agora se afastavam ruidosamente os bolcheviques, para quem todos os outros passavam a ser “renegados” da causa proletária. E sobre esses traidores deveria recair um anátema ainda mais virulento do que o dedicado aos inimigos de classe. Uma esquerda afeita ao confronto nascia aí, motivando seus gestos extremados com a expectativa messiânica da revolução mundial.

Nos anos 1930, em textos até mesmo de comunistas heréticos, impressiona o uso mais ou menos corrente de palavras como “total” ou “totalitário”. O seu marxismo, ainda que se desviasse da ortodoxia, também se pretendia a matriz integral de uma nova civilização. Ele bastava a si mesmo, recusava acréscimos externos. O Estado soviético, que parecia imune a crises como a de 1929, podia ter uma forma política tosca, primitiva. Não importava: havia quem dissesse, pragmaticamente, que a pior ditadura do proletariado era sempre preferível à melhor democracia burguesa…

A similitude com o Estado hitlerista era patente. O partido único, a arregimentação militarista das massas, o culto irracional ao líder carismático, entre outros elementos aterradores, confirmavam a semelhança e pretendiam atestar a obsolescência das formas democráticas. A superioridade racial apregoada de um lado parecia corresponder, grosso modo, à situação do lado adversário, em que uma classe supostamente universal construía seu próprio Estado e se arrogava o direito de submeter – ou liquidar, como no caso dos camponeses – grupos sociais inteiros.

No entanto, a esquerda jacobina convertida em Estado, que dividia o mundo em campos inconciliáveis e, por isso, era bárbara, tinha elementos que a levavam além do confronto e do desafio sectário. Às vezes, como no caso das frentes populares antifascistas, aproximava-se dos socialistas e dos “democratas burgueses” e via-se obrigada a questionar seus próprios dogmas, a imaginar caminhos diferentes do que tomara em 1917 e a levara a condescender com formas “totais” de poder. Apesar de si mesma – isto é, apesar dos traços odiosos da sua rudimentar construção estatal –, esteve maciçamente ao lado do Ocidente democrático e contribuiu de modo inestimável para vencer o mal absoluto. Stalin à parte, todo democrata em algum momento se sentiu drummondianamente irmanado “com o russo em Berlim”.

Esta breve memória talvez ajude a entender por que, depois do comunismo, há múltiplas razões para uma esquerda agora sem a menor complacência com as sociedades “totais”, sem excluir as que resistem anacronicamente. Nos países democráticos, as fúrias voltam a se desatar, os moedeiros falsos retomam o labor de sempre e os demagogos desempoeiram velhos figurinos. Por isso é preciso tornar à ideia da grande aliança contra todos os que se mobilizam para corroer as bases da democracia liberal.

 

  • Sobre
  • Últimos Posts
Luiz Sérgio Henriques
Luiz Sérgio Henriques
Tradutor e ensaísta, editor do site Gramsci e o Brasil (www.gramsci.org).
Luiz Sérgio Henriques
Últimos posts por Luiz Sérgio Henriques (exibir todos)
  • Luiz Sérgio Henriques: Os vivos e os mortos - 19 de julho de 2020
  • Luiz Sérgio Henriques: Fascismo e antifascismo - 21 de junho de 2020
  • Luiz Sérgio Henriques: Os heróis da retirada - 17 de maio de 2020

Fonte:

O Estado de S.Paulo

https://opiniao.estadao.com.br/noticias/espaco-aberto,a-cidade-e-os-barbaros,70002798126

Tags Luiz Sérgio Henriques, O Estado de S. Paulo

O que você pode ler a seguir

Cristovam Buarque: ‘Suissinato’ do futuro  
O Estado de S. Paulo: Após cúpula histórica, Trump diz que interromperá ‘jogos de guerra’ na Península Coreana
André Lara Resende: Do consumismo à civilidade

Deixe uma resposta Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pesquisar

Postagens Recentes

  • Míriam Leitão: Por um ajuste sem granadas e jabutis

  • Merval Pereira: Os extremos se encontram

  • Vera Magalhães: Karol Conká, Bolsonaro e o foco da indignação

  • Cora Rónai: Kruela Kruel e o paradoxo da intolerância

  • Mariliz Pereira Jorge: Instituições barram ímpetos golpistas do presidente, mas não de seus seguidores

ENCONTRE AQUI

  • A FAP indica
  • Trabalhe Conosco
  • Editais
  • Webmail
  • Curta a Esquerda Democrática no Facebook

INFORMATIVO FAP

CONTATO

Telefone: (61) 3011-9300
Email: contato@fundacaoastrojildo.org.br

Fundação Astrojildo Pereira

CNPJ: 04575883/0001-19
SEPN 509, bloco D, Lojas 27/28, Edifício Isis - CEP: 70750-504 - Brasília-DF

Abrir no Google Maps

  • Obter Redes Sociais
Fundação Astrojildo Pereira

© 2015-2018 Todos os direitos reservados. - Astrojildo Pereira - FAP.

TOPO