Denise Paiva
Sim, é possível uma humanidade melhor” (discurso do presidente do Uruguai, Pepe Mujica, na ONU, set./2013)
Alguns temas são palpitantes e motivam um diálogo com a juventude. Exemplos: Redes Sociais, Educação, Cultura, Diálogo com o Governo, Direito de se Associar, Mercado de Trabalho, Objetivos do Milênio, Respeito às Diferenças, Segurança, Maioridade Penal, Sexualidade, Participação Política, Drogas.
O protagonismo juvenil, a participação ativa do jovem como sujeito da história se impõe ao clamor e à necessidade do conjunto da sociedade, ao chamamento na definição das prioridades nas politicas públicas.
O futuro dos que nos antecedem e dos que nos sucedem depende, sobretudo, dos jovens, no aqui e no agora.
As redes sociais são a grande revolução do mundo contemporâneo. Nenhum outro meio tecnológico e de interatividade é mais capaz de mobilizar, conscientizar e organizar as pessoas e promover a cidadania.
Quando falamos em juventude em rede, devemos qualificar: Juventude em rede para a cidadania.
As redes sociais da juventude podem, além de expressar sonhos e projetos, reivindicar, exigir e fiscalizar o cumprimento das ações do poder público no encontro das necessidades e aspirações da sociedade, traduzidas em políticas públicas efetivas, sobretudo a educação de qualidade para todos.
Nenhum outro meio, a não ser as redes sociais, é tão capaz de desmascarar os que se apropriam da representação popular, contrariando o interesse público.
Temos que ter sempre em mente que, ao longo da história, existem forças poderosas e muito atuantes, com fortes conexões, manobrando para que as mudanças no interesse coletivo e da verdadeira evolução e transformação social não aconteçam. Tais forças não dormem, nem sequer cochilam, mas elas podem ser adormecidas, se surpreendidas por uma nova força inusitada, emergente, fresca: a força da juventude, a força das redes sociaiscomprometidas com a cidadania, a democracia, os avanços sociais, políticos, econômicos e sociais.
É imponderável, é espetacular, a força das redes sociais e da internet para conscientizar e articular o movimento social de forma barata, rápida e eficiente.
A ideia de espaço, distância, se relativizou. A informação, até então restrita, se publicizou.
Estamos no advento vigoroso da Era da Informação, da comunicação. Eis a Era na qual o novo ganha espaço, e os anseiosrobustos, frescos e animados da juventude se legitimam.
Creio que a capacidade de mobilização e de provocar mudanças está nas mãos de rapazes e moças.
Nosso grande desafio é pensar o novo sob uma perspectiva de evolução pacífica, mas sem deixar de pensar no salto de qualidade que as manifestações das ruas passaram a clamar de forma retumbante no Brasil contemporâneo.
O gigante Brasil acordou? Está acordando?
Não creio que estivesse dormindo. Fomos reprimidos, açoitados, acuados, amedrontados, até que um dia, como se fosse do nada, como de geração espontânea, ou por algo que como o transporte urbano que revela de forma tão brutal a inversão do interesse público, o gigante acorda, espreguiça, ocupa os espaços que lhe convém e, sobretudo, o que lhe é de direito: O Direito à Indignação.
O gigante aparentemente sonolento, letárgico, indiferente às injustiças e às lutas sociais, foi acordado corajoso e mais forte pelas redes sociais, pela juventude em rede, pela cidadania.
Aparentemente, tênues e imbricados são os contornos e limites da expressão legítima da cidadania com a expressão da violência.
O processo de debate, conscientização, mobilização, reivindicação, controle social e fiscalização, em nome do interesse público, deve ser feito sem confronto, sem provocação, sem violência, por parte de quem quer que seja.
O direito e a ética embasam a evolução humana no caminho de uma civilização mais justa e fraterna e estarão sempre, lado a lado, por um mundo melhor, pela construção de uma nova ordem.
A paz é imperativa, a paz é solo e semente da construção do novo, pelo qual todos nós almejamos e devemos arregaçar as mangas.
Não estamos defendendo a paz dos cemitérios, mas estamos falando de uma paz inquieta, crítica, criativa, solidária e libertária.
A paz é a antítese da violência, esta sim, irmã siamesa do egoísmo, da intolerância, da opressão e, sobretudo, da exploração entre seres humanos iguais, igualdade ontológica, que reside na própria essência de ser humano.
É preciso ter em mente que as redes sociais, protagonizadas pela juventude, podem ser objeto de controle e manipulação. Precisamos identificar e combater o controle e interceptação que algumas forças pretendem estabelecer sobre o direito à comunicação.
Tal questão serve de alerta e lição a um duplo título: primeiro, o cuidado que se impõe, sobretudo, levando em conta a impulsividade natural dos jovens; e, segundo, a defesa de um valor maior, decorrência do próprio princípio da dignidade da pessoa humana, que é o direito à inviolabilidade, à privacidade e à intimidade dos seres humanos.
Novos e eficientes mecanismos de interação e comunicação não podem ser submetidos aos interesses conservadores, às forças que sustentam o atraso e a exclusão social.
Precisamos ter antídotos, que sejam células ou núcleos de resistência contra a virulência dos agentes comprometidos com a manutenção do status quo.
Devemos e podemos criar e fortalecer o que os jovens chamam de “redes do bem”, redes que procuram intercambiar o mundo virtual e o mundo real, numa relação harmoniosa. A internet nos coloca no mundo, mas não garante a relação com a vida.
A vida mais criativa e produtiva para os jovens se dá nas relações com a família, com os vizinhos, com a comunidade. Se dá nas organizações da juventude, como nos grêmios, nos times de futebol, nos cineclubes, casas de cultura, associações de modo geral.
Nossas esperanças, as de várias gerações, desde os que ainda estão no ventre materno até os que já se encontram no ocaso da vida, estão, sem dúvida, nas mãos dos jovens.
Os jovens devem assumir um papel de vanguarda na história, identificando e refletindo sobre os problemas que afligem não só a eles, mas a toda a sociedade, a todas as gerações.
Os Conselhos da Juventude devem sugerir e ajudar a definir, com os demais Conselhos, pautas e agendas comuns nas prioridades, nas várias esferas da Federação.
Os segmentos da juventude dos partidos políticos devem contaminar o conjunto do seu partido com suas pautas.
Os jovens precisam refletir sobre atitudes concretas, no plano pessoal e interpessoal, sobre as possibilidades de transformação que podem ser operadas no contexto da família, da vizinhança e, sobretudo, da escola, independente do Poder Público e da ação governamental.
Novos conceitos, valores, atitudes e comportamentos compatíveis com a inovação, a solidariedade e a responsabilidade social podem/ devem ser debatidos, divulgados para atingirem a coletividade.
Tirar o “R” da palavra “Arma” a transforma em “Ama”, mudar o “R” de lugar a transforma em Amar. É um gesto simples e simbólico. Quantas coisas podem ser mudadas no cotidiano das nossas vidas, para que nos tornemos melhores pessoas, melhores profissionais, melhores cidadãos.
Quais seriam algumas pinceladas para um enredo de transformação social, de invenções democráticas e de construção de felicidade? Quando falamos de drogas, devemos entender que a droga é a resposta à não resposta.
Quando falamos de sexo, devemos procurar no Plano Nacional de Direitos Humanos o direito a uma sexualidade saudável e à paternidade e maternidade responsáveis.
Quando falamos em maioridade penal, devemos antes de cedermos ao discurso tentador/enganador do enrijecimento penal como solução para a problemática da segurança, nos atermos às interpretações sistêmicas de tal fenômeno, isto é que assegurem a visão do todo e da inter-relação entre todas as partes de um mesmo problema.
Neste sentido, devemos nos debruçar, seriamente, sobre as causas, para nos empenharmos mais severa e responsavelmente com as ações, programas e políticas públicas preventivas.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei de 1990, ainda clama por sair do mero plano da validade formal.
Trazer toda responsabilidade do aumento da violência urbana para os adolescentes, a fim de legitimar uma redução da idade da imputabilidade penal, soa tão ineficaz quanto desarrazoado ou descabido. Devemos demarcar bem os limites que podem confundir esta posição com a falta de responsabilização. A criança, desde a mais tenra idade, precisa de limites, precisa conhecer o sim e o não, e o talvez.
A liberdade de um indivíduo termina quando inicia a liberdade do outro. Existem valores universais, consagrados que precisam ser afirmados e perpetuados. Dizer que o adolescente, autor de um ato infracional, necessita de uma proteção social e atenção especial e diferenciada, no seu processo de recuperação, não significa que ele não seja responsabilizado pelos seus atos, por meio de uma legislação que busque, de forma específica, a educação como a prevista na lei.
Quando falamos em mercado de trabalho, devemos aprofundar sobre empreendedorismo, economia solidária, cooperativismo, indústria criativa, além da gama infinita de possibilidades que o mercado formal nos oferece. Devemos lutar contra e condenar severamente o trabalho infantil. Lugar de criança é na escola.
Quando falamos em educação, devemos avaliar o quanto nossos parâmetros curriculares estão defasados das exigências da vida e do trabalho, e a assustadora precarização do ensino público, no qual ressalta a irrisória valorização dos professores.
Quando falamos em diálogo com o governo, devemos falar de parcerias, participação criativa, autonomia, qualificação de demanda e corresponsabilidade com as tarefas que podem e devem ser assumidas em conjunto e contribuem para o aperfeiçoamento do Estado democrático.
Sobre cultura, propomos uma reflexão muito especial. Cultura não é algo fora de nós, que podemos, eventualmente, adquirir por um treinamento, uma casca, uma superfície brilhante. Um livro, por exemplo, não é um objeto inerte numa biblioteca, mas sim uma mensagem que podemos tornar viva e incorporar como uma segunda pele.
Cultura é algo vivo e que nos constitui existencial e moralmente. É roupa que vestimos, a comida que comemos, os sonhos que compartilhamos. Cultura é a cidade em que vivemos, o passado que vem até nós, e, especialmente, o presente e o futuro que queremos e podemos construir juntos, de modo criativo, solidário e sobretudo responsável na visão de conjunto de toda a humanidade e de todo o planeta.
A cultura é capaz de nos retirar da solidão do individualismo e do consumismo, solidão na qual dizia o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade: “se desaprende a linguagem com que homens e mulheres se comunicam”.
Concluindo: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”. Esta mensagem do imortal Rui Barbosa, na sua celebre Oração aos Moços, em 1929, traduz a expressão de um sentimento de desilusão e desencanto que não pode contaminar a juventude.
Hoje, dispomos de instrumentos de conscientização, de mobilização e luta jamais conhecidos e imaginados. Ser jovem e não ser revolucionário, não ser comprometido com o NOVO, é uma contradição antes de tudo biológica.
Juventude, em rede para cidadania; avante, em marcha, rapazes e moças sempre movidos pela esperança, “inquietude em forma de ação”, como ensina Pierre Furter.
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